No dia 27 de novembro de 2023, a sentença proferida nos autos de processo de nº 7028198-33.2023.8.22.0001 trouxe à tona uma questão relevante no âmbito do fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar. O caso envolveu beneficiária que, diagnosticada com um raro caso de endometriose afetando o diafragma, buscava a disponibilização de Canabidiol Medicinal como parte essencial de seu tratamento, visando a melhoria de sua qualidade de vida mediante a redução das dores crônicas.
A sentença, ao analisar os principais aspectos da demanda, delineou a extensão da responsabilidade do plano de saúde no fornecimento de medicamentos “off-label”. Mesmo com aprovação, registro na ANVISA e recomendação médica explícita, a decisão ressaltou a exclusão de cobertura para medicamentos domiciliares fora do ambiente hospitalar.
Nesse mesmo contexto, o Tribunal de Justiça de Pernambuco (processo nº 0007887-22.2023.8.17.8201) também reconheceu a ausência de obrigação por parte do plano de saúde em fornecer bomba de infusão de insulina a um beneficiário diagnosticado com Diabetes. Para mais, salientou que o Superior Tribunal de Justiça mantém o entendimento de que a responsabilidade pelo fornecimento de medicamentos, fora das disposições normativas, recai sobre o Estado e não sobre o plano de saúde.
O impacto dessas decisões transcende a esfera do caso específico, consolidando-se como precedentes de grande relevância em diversas dimensões. Em primeiro lugar, estabelecem padrões que podem ser evocados em situações semelhantes, desafiando a interpretações divergentes adotadas pelo ordenamento jurídico.
O STJ (REsp 1.883.654) já estabeleceu um entendimento de que o fornecimento de medicamentos para uso domiciliar não se enquadra entre as obrigações legais mínimas das operadoras de saúde, com exceção dos antineoplásicos orais (utilizados no combate ao câncer) e medicamentos correlatos, bem como daqueles aplicados em home care e constantes na lista da Agência Nacional de Saúde (ANS) como de fornecimento obrigatório. Por conseguinte, o posicionamento adotado pela Corte Cidadã ressalta a falta de uma obrigação legal mínima por parte das operadoras de planos de saúde no que tange ao fornecimento de medicamentos de uso domiciliar.
Por outro lado, o STJ, conforme manifestado no Recurso Especial (REsp) 1943628/DF, também concluiu acerca do fornecimento obrigatório do canabidiol, quando sua importação é devidamente autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Se comprovada a necessidade do medicamento para o tratamento do paciente, respaldada pela prescrição médica e devido à condição que o aflige, torna-se imperativo que o plano de saúde providencie o fornecimento.
Essa diferenciação de entendimento sublinha a complexidade do tema e a importância de análise cuidadosa em cada caso, buscando harmonizar as perspectivas jurídicas e as necessidades específicas dos beneficiários.
Diante desse cenário, as sentenças apresentadas se destacam como um marco significativo na busca pela resolução efetiva de questões de saúde em cada situação específica, sobretudo no contexto da massificação do direito à saúde. Elas abordam de maneira consolidada a análise médica detalhada sobre a necessidade do tratamento, esclarecendo a ausência de obrigação por parte da plano de saúde no fornecimento de medicamentos fora do escopo ambulatorial.
Quanto à orientação jurídica, as decisões representam uma referência valiosa para litigâncias futuras, delineando uma abordagem mais restritiva no que se refere ao fornecimento de medicamentos para uso domiciliar. Este posicionamento contribui para o progresso do ordenamento jurídico, direcionando-o a uma perspectiva predominante de que as operadoras de plano de saúde não possuem a obrigação de disponibilizar medicamentos para utilização em casa. No entanto, ressalta-se a necessidade de o judiciário atentar-se minuciosamente a cada caso, buscando uma resolução assertiva e contextualizada para o mérito em questão.
Para as operadoras e os advogados que estão lidando com casos similares, a decisão representa uma oportunidade para realizar uma revisão estratégica, uma vez que o precedente positivo pode exercer influência sobre as decisões futuras, bem como custeio indevido de medicamentos. Além disso, a expectativa dos beneficiários em relação aos seus próprios casos pode ser ajustada com base nesse novo paradigma jurídico, buscando a obtenção de acordos extrajudiciais quando apropriado e, ao mesmo tempo, evitando aventureiros legais e ações predatórias.
Em última análise, a sentença torna-se um marco importante, não apenas no contexto específico do fornecimento de Canabidiol Medicinal e bomba de insulina, mas também como uma contribuição significativa para a construção de jurisprudência relacionada ao fornecimento de medicamentos domiciliares.